Paratletas rumo ao pódio
- Admin
- 6 de dez. de 2018
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Os obstáculos que os atletas com deficiência enfrentam para romper as barreiras psicológicas, físicas e principalmente financeiras.
O esporte transforma vidas para melhor, além de ser um hábito saudável, um instrumento de sociabilização e integração na sociedade. Seja na modalidade individual ou em grupo, a atividade esportiva só traz benefícios. O esporte é o caminho próspero para alcançar a autoestima e superar dificuldades, tanto psicológico como físico.
A dificuldade de praticar esportes, seja amador ou profissional, começa pela falta de investimento, pois a busca por patrocínio não é fácil, já que muitos atletas têm que ir em busca da contribuição financeira do segmento empresarial para manter o desporto. O esforço é desgastante, pois além da preocupação com a melhoria do desempenho físico, existe também a preocupação com o lado burocrático.
Patrocínio é algo muito difícil para os atletas que possuem deficiência, alguns tiram dinheiro do próprio bolso para custear o esporte e muitas vezes, bancar equipamentos para os treinos, vestimenta adequada, viagens, estadias e o sustento familiar, situação que aflige atletas convencionais e paratletas, onde a situação é ainda mais agravante, pois as modalidades não são conhecidas do grande público e não despertam o interesse de investimento das empresas. Alguns recebem bolsa atleta ofertado pelo governo, mas para isso é preciso estar entre os primeiros colocados de sua categoria.
Os atletas jovens descobrem logo cedo os obstáculos financeiros. Não basta o talento, a dedicação e o esforço para obter bons resultados, o investimento ainda é uma parte essencial para o atleta e Maria Raiane Lúcia da Silva de 15 anos percebeu isso. “No inicio pensava em desistir, pois minha família não tinha condições para me manter nas competições”. Ela entrou para o esporte depois que sofreu uma lesão em uma das pernas num acidente de trânsito quando tinha nove anos, pensou que nunca mais seria feliz. “Não foi fácil passar por isso”, se emocionou a atleta.
A superação veio com o esporte. A moradora da cidade de Gravatá, agreste pernambucano, começou na prática esportiva na Escola Municipal Cônego Eugênio Vila Nova, de forma recreativa, sob a orientação e incentivo do professor de educação física Hamilton César. “Só tenho que agradecer por tudo que ele vem fazendo por mim”, disse Maria Raiane que hoje é paratleta medalhista no Parabadmintom e no tênis de mesa. Com os resultados obtidos, foi indicada á Seleção Brasileira e tem a possibilidade de representar o país nos Jogos Paraolímpicos de Tóquio em 2020, no Japão. “Venho conquistando meu espaço, e estou muito feliz com os resultados” afirmou a atleta.
Hamilton César passou de professor a treinador e consegue, com muito esforço, o deslocamento dos atletas para participar dos campeonatos. “Primeiro a gente tem que ter apoio da gestão escolar e depois dos pais. O patrocínio é a nossa boa vontade de fazer acontecer. Enquanto as instituições públicas não tiverem projetos específicos para beneficiar as pessoas com deficiência a situação fica difícil”.
Elton José de Oliveira ficou deficiente depois de uma cirurgia para retirada de um tumor cerebral aos 24 anos de idade “A minha sorte foi que o tumor do tamanho de uma moeda de um real, era benigno”. Após a cirurgia ficou com sequelas que o colocou na cadeira de rodas. “Eu tinha duas opções, ficar em casa me lamentando ou correr atrás do prejuízo e ser atleta me ajudou muito”. Com 36 anos é o segundo no arremesso de peso no pernambucano e treina no campo de futebol da Universidade Federal de Pernambuco. “Tudo a gente tem que arcar, da cadeira de arremesso ao peso. Quando se destaca aparece os “papagaios de pirata” dizendo que vai ajudar, só para sair bem na foto, mas não passa disso”.
Caio Augusto, 28 anos, também treina na UFPE e possui deficiência intelectual desde que nasceu. “Segundo minha mãe, foi erro médico durante o parto”. O paratleta da modalidade Atletismo, é o primeiro do ranking em Pernambuco e na modalidade de arremesso de disco, é o quarto, em ranking nacional. No início, Caio nem sonhava em ser atleta profissional, mas pegou gosto pelo que faz e agora não desiste, seja qual for o obstáculo. “Temos que fazer cota para um monte de coisas, até para treinar, mas desistir nunca. Essa palavra não consta no meu dicionário”.
Segundo Caio, ele emagreceu 25 quilos desde que começou a praticar esportes e a maior conquista que obteve com o desporto foi a independência, a partir da descoberta de que é capaz de fazer o que quiser, mesmo com todas as dificuldades físicas e com o preconceito imposto pela sociedade. “Como cadeirantes, sofremos com a falta de calçadas e rampas adequadas, na maioria das vezes temos que andar rua, entre os carros. Já nos coletivos, os elevadores quebrados dificultam a sair e chegar no horário. Me programo com antecedência para tentar não atrasar”. Além dessas dificuldades, fazer compras também é um desafio para o paratleta. “Supermercados, lojas e farmácias não estão adaptados para receber cadeirantes, onde vemos uma estrutura um pouco melhor, são nos grandes shoppings. Aí eu te pergunto quem é deficiente aqui?”, questionou o paratleta, chateado com a falta de compreensão e a limitação imposta pela sociedade aos deficientes e portadores de mobilidade reduzida.
Valdemir José Rodrigues, o “Miro”, é quem auxilia Caio, Elton e outros paratletas nos treinos, com o apoio técnico. Miro está no projeto há 17 anos. “É um trabalho muito gratificante, ver o resultado obtido por cada um, é uma vitória mesmo. A sociedade os tratam como coitadinhos, mas eu não os vejo dessa forma, vejo pessoas com capacidade de realizar seus objetivos. As pessoas têm que ter um pouco mais de respeito com os deficientes físicos”, esclareceu.
por Ernani Neves
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